quarta-feira, 27 de abril de 2022

O experimento de Millikan.

Se você já se familiarizou com os modelos atômicos de Dalton (link) e Thomson (link) e se aprofundou (link) neste último, creio que é capaz de entender o que está por vir. Falarei de um sujeito inteirado das novidades a respeito da natureza microscópica da matéria no início do século XX, que sabia muito bem sobre o experimento de Thomson quando este determinou a razão entre a carga e a massa do elétron.

Robert Andrews Millikan

Millikan soube que, se determinasse a carga de um elétron, também determinaria a massa dele. A questão é: como determinar a carga de um elétron? Ele teve uma ideia razoavelmente simples, se eletrizasse uma gota de água e a colocasse em uma região sob influência de um campo elétrico, a gota estaria sujeita a forças de natureza elétrica e gravitacional (peso). Não deveria ser difícil chegar a um resultado. Pois a força elétrica depende da carga e do campo elétrica, e o peso depende da massa e da gravidade.

Diagrama do experimento de Millikan.

Ele montou algo parecido com a imagem acima. Borrifar água dentro de uma câmara, esperar as gotas passarem pelo orifício, bombardeá-las com  raios X para ionizá-las e aplicar um campo elétrico ao eletrizar as duas placas horizontais. Mas percebeu que as gotas de água evaporavam, dificultando e muito sua medida. Buscou então uma substância capaz de aguentar todo o processo em vaporizar. Decidiu usar óleo mesmo e se cercou de vários detalhes.

Equipamento usado por Millikan.

Na vida real as coisas são um pouco diferentes. Veja o equipamento usado por Millikan. Quase uma panela de pressão. Como ele veria as gotas de óleo ali dentro? Precisava de algo para iluminar. Outro detalhe, note que o borrifador possui um filtro para impedir a poeira de entrar dentro do equipamento. De forma completa, o equipamento era assim:

Equipamento completo do experimento de Millikan.

Note o tubo horizontal ao centro da foto. A luz emitida por uma lâmpada atravessava um tubo de um metro de comprimento preenchido com uma solução aquosa de sulfato de cobre. Após atravessar este tubo, a luz perderia parte de sua energia e geraria menos efeitos indesejados sobre as gotas.

Equipamento com destaque para a fonte de luz e o tubo. Imagem retirada do canal "equimicaiq".

Tudo elaborado, restava fazer os experimentos e coletar os resultados, vamos às observações de Millikan:

Gotas de óleo observadas por Millikan.

Aqueles dois pontinhos clarinhos na imagem acima são duas gotas de óleo entre tantas possíveis. Algumas estavam em repouso, outras subindo, outras descendo. De posse da régua e de um cronômetro, ele determinou a velocidade com que se deslocavam, pois esta será importante para as contas que virão a partir de agora. Tomando a gota em repouso, Millikan estabeleceu o seguinte:

Situação na qual a resultante das forças que atuam sobre a gota é nula.

Ajustando com uma bateria as cargas nas placas, Millikan foi capaz de ajustar uma situação na qual a gota se encontrasse em repouso. Como a placa de cima é positiva, o campo elétrico tem direção vertical voltado para baixo, pois suas linhas partem da placa positiva para a negativa. Partículas dotadas de cargas negativas sofrem ação de uma força de natureza elétrica com mesma direção do campo, mas sentido oposto. Além disso, a gota sofre a ação do empuxo causado pela atmosfera. Por isto a gota pode se encontrar em repouso.

Emp + Fₑₗₑ = P

ou

Fₑₗₑ = P - Emp

A força elétrica é o produto da carga "q" pelo campo elétrico "E" ali atuante. O empuxo está representado por "Emp" e é o produto da densidade "dₐ" do ar pela gravidade "g" e pelo volume "V" da gota. E a força peso é o produto da massa "m" pela gravidade "g". Para não escrever as duas barrinhas sempre, adotarei a ideia de que se trata do módulo de todo mundo. 

Eq = mg - dₐgV

Sem saber a massa de uma gota em especial, Millikan adotou a massa como sendo o produto da densidade "dₒ" do óleo pelo respectivo volume "V" dela.

Eq = dₒVg - dₐgV

Eq = Vg(dₒ - dₐ)

Chegamos à relação entre as densidades do óleo e do ar, o volume da gota, gravidade e campo elétrico.

q = (dₒ - dₐ)Vg/E

Se soubermos o volume da gota, saberemos a carga elétrica dela. Millikan assumiu a gota como sendo esférica, logo seu volume é:

V = 4𝝅R³/3

Então a carga elétrica da gota pode ser escrita em termo do raio R dela:

q = (dₒ - dₐ)4𝝅R³g/3E

Resta dizer qual é o raio da gota caso ela tenha formato esférico. Para esta parte Millikan desligou a bateria cronometrou o deslocamento da mesma gota que estava em repouso. Ele consegue relacionar o raio R da esfera com a velocidade medida a partir do cronômetro e da régua. Isto graças à equação de Stokes.

George Gabriel Stokes

Na ausência de campo elétrico, caso a partícula se desloque com velocidade constante, a força de arrasto "F" causada pela viscosidade do ar empatará com a diferença entre peso e empuxo:

Fₐ = P - Emp

6𝝅𝜼Rv = 4𝝅R³g(dₒ - dₐ)/3

R² = 9𝜼v/2g(dₒ - dₐ)

Onde "𝜼" é a viscosidade do ar e "v" é a velocidade da mesma gota. Isto nos leva à seguinte expressão para o raio da gota:

Raio da gota em função da viscosidade do ar, da aceleração da gravidade, das densidades do óleo e do ar e da velocidade da gota dentro do ar entre as placas.

Basta agora inserir esta expressão para o raio R dentro da expressão para a carga elétrica:

Equação para a carga de uma gota de óleo em função de sua densidade, da densidade e viscosidade do ar, da aceleração da gravidade e do campo elétrico entre as placas.

Com isto Millikan chegou na carga do elétron? Não... o pior é que não chegou. Pois em momento algum as gotas eram eletrizadas com apenas um elétron para medir sua carga. Mas eram eletrizadas com quantidades finitas de elétrons, de modo que ele fez milhares de medidas e todas elas eram múltiplas de um valor fundamental, um divisor comum. Com isto ele chegou ao valor de 1,59x10⁻¹⁹ C, sendo que o valor hoje conhecido é de 1,602x10⁻¹⁹ C. Um estupendo resultado.

E quanto à massa do elétron? De posse da carga, basta dividi-la pela razão carga massa medida por Thomson, com valor de 1,754x10¹¹ C/Kg. E temos o valor da massa do elétron é 9,1x10⁻³¹ Kg.

Fica a observação de que esta é uma apresentação para ensino médio e muitos detalhes foram mastigados. Outras equações "diferentes" são encontradas com informações extras de mecânica de fluidos aqui ignoradas para facilitar a compreensão.

Alguma dúvida? Comenta aí. Até a próxima.

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